quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Poeta Contemporâneo: Vasco Gato


Hesito muito antes da palavra.
porque um precipício se abre nela
e não tem sentido,vibra apenas.
porque pode ser a morte
ou o nascimento para um lugar
de cores e fadas e barcos de sol.
porque me doem as mãos
cada vez que tento segurar
o mundo em traços redondos quadrados.

por isso te digo: hesito e morro e nasço.
e corro para a rua com a força de quem
vai anunciar gritar chamar dizer.
mas lá fora sorrio apenas
enquanto caminho para um banco
de jardim,devagarinho,
como se por um momento
eu soubesse o nome de tudo
e tudo tivesse o mesmo nome.

{Vasco Gato}

Vasco Gato nasceu em Lisboa no dia 30 de Março de 1978. Estudou Economia, tendo-se dedicado posteriormente à Filosofia.

«a minha alegria é o aroma de tangerina nos dedos»

É um dos novos poetas dos anos noventa que se está a impor na moderna literatura portuguesa com um assinalável ritmo de publicações.

«diz-me que há ainda versos por escrever,
que sobra no mundo um dizer ainda puro»

Com o seu novo livro “Omertà” Vasco Gato prova que ainda poder ir muito longe com a sua poesia, o livro foi muito bem recebido pela critica que diz que ele conseguiu moldar e depurar uma linguagem capaz de aliar, com inteligência e elegância, o ímpeto metafórico com uma certa narratividade.

«Tu e eu, leões estirados ao sol,
harpa para os nossos dedos quentes,
poema numa sala de lâminas.»

Uma das vozes mais importantes da novíssima poesia portuguesa, que encanta como sempre os poetas desta doce terra.

«Em cada quarto um ser procura a presença do seu próprio rosto.»

Mostro alguns dos poucos poemas que encontrei deste poeta, mas que são de grande profundidade!

“e na palma da tua mão
busco ternura
sem contar meses,
anos, dias,
sem saber dizer
se já te chorei
por inteiro
o suficiente
para não voltar
a perder-te. “

"Imagino que sobre nós virá um céu
de espuma e que, de sol em sol,
uma nova língua nos fará dizer
o que a poeira da nossa boca adiada
soterrou já para lá da mão possível
onde cinzentos abandonamos a flor.

dizes: põe nos meus os teus dedos
e passemos os séculos sem rosto,
apaguemos de nossas casas o barulho
do tempo que ardeu sem luz.
sim, cria comigo esse silêncio
que nos faz nus e em nós acende
o lume das árvores de fruto.

diz-me que há ainda versos por escrever,
que sobra no mundo um dizer ainda puro."

"invocação

por ti deitei o meu corpo ao mar
sem cuidar que a maré me esquecesse
por ti aprendi como as coisas se tocam
como o trigo estende o vento e a terra
como amanhecem as crianças sobre as mães

por ti dormi no sobressalto dos vales
entre sossegos mudos e noites espessas
por ti toquei a gravidez das nuvens
toquei os filhos semeados no inverno
toquei a mulher que espanta o frio

e imaginei que me ouvisses na distância
que me lembrasses a meio do mês branco
quando nos campos as pétalas escrevem
o teu nome quando a mão anuncia a ternura
que é quando os meus olhos procuram os teus"

Simplesmente... maravilhoso! Fiquei impressionada!

3 comentários:

Cravo a Canela disse...

Eureka!!! Temos que ver mais...

A CONCORRÊNCIA disse...

E viva a juventude. É urgente a descoberta de novos talentos ...

Leticia Gabian disse...

Mais uma vez, agradeço pela partilha!
É mesmo de impressionar pela talentosa sensibilidade... E veja que é apenas um miúdo... Tem a idade que meu filho Ian teria...

Beijocas grandes